Lilith: o mito da primeira mulher do mundo
Religiões diversas, hebraicas, babilônicas e até cristãs, mencionam a existência da primeira mulher do mundo, Lilith. Porém, desde o início dos tempos, sua história foi ofuscada, distorcida, não contada.
O seu mito é também a história de como a humanidade enxerga o desejo feminino e nossa relação com o próprio corpo. Compreender o mito de Lilith é também, independente de sua crença ou religião, entender como chegamos até aqui enquanto humanidade.
Ela é a protagonista da história não contada. A primeira mulher do mundo. Aquela que veio antes de Eva. Nascida do barro, segundo o mito, Deus teria criado “homem e mulher” à sua imagem e semelhança. Lilith significa, em linguagem suméria, “alento”, o sopro divino.
Naquele início, anterior a qualquer história já contada sobre o primeiro homem e a primeira mulher, Lilith era a representação mais pura e vigorosa do feminino. Em potência, essência e manifestação. Sua origem divina não a reduzia a nenhuma costela. Era igual ao homem. E, portanto, tinha a liberdade de fazer seus desejos serem respeitados e seu prazer atendido.
No mito que sobreviveu até os dias de hoje, conta-se que, no momento em que ela e o primeiro homem se juntaram, puseram-se a discutir. Ela não aceitava permanecer abaixo dele durante a relação sexual. Sabia de sua igualdade e, por isso, exigia que ele mudasse sua postura. Ele, indignado, recusou-se a ceder aos desejos femininos. Sua resposta foi, então, abandoná-lo para sempre.
Anjos foram chamados por Deus para convencê-la a mudar de ideia, mas nada foi capaz de fazê-la ceder aos desejos do primeiro homem.
O mito de Lilith, na formação das primeiras sociedades patriarcais, era uma ameaça a qualquer estrutura de dominação masculina. Em diferentes religiões, visões de mundo e mitologias, ela foi retratada como sinônimo de uma força insurgente, símbolo do pecado, esposa do demônio, levando com ela a sexualidade feminina para o mesmo espaço do proibido.
A história precisaria, com isso, ser recontada. A primeira mulher criada por Deus foi apagada da história para que aquela, nascida da costela, Eva, protagonizasse o Jardim do Éden. Frágil, nascida da parte, desprovida da sua inteireza, e submissa aos desejos do primeiro homem. Ainda sim, culpada pela vergonha do corpo, a expulsão do Paraíso e a perda de inocência da humanidade.
No livro de Martha Robles e Débora Dutra Vieira “Mulheres, Mitos e Deusas: O feminino através dos tempos”, as autoras contam que “Lilith ensina que, antes mesmo que Eva reconhecesse a beleza do corpo, a mulher já estava preparada para assumir seu erotismo com o mesmo vigor em que impunha sua presença em um mundo totalmente submetido aos ditames divinos.”
Hoje, conta-se que Lilit mora nos oceanos mais profundos, vigiada e censurada por guardiões supremos que não a permitem voltar à Terra. Porém, cada vez que uma mulher exige seu direito de liberdade ou descobre o mais íntimo de sua potência criativa, diz-se que é reflexo de uma de suas sombras voltando ao mundo para emancipar todas aquelas que se descobrem também Lilith.
As autoras continuam, no mesmo capítulo: “Sempre renovada e infatigável, Lilith se aloja em cada mulher que imagina ser possível a verdadeira equidade, em cada mulher que perturba os sonhos e devaneios dos homens, naquela que menciona o inefável nome de Deus não para acatar seus desígnios, mas para salientar o alento transformador de sua própria criatividade.”
Do mito Lilith, nasceu a inspiração para a Lilit. Um espírito livre, que não aceitou a posição de submissão e exigiu também ter direito ao gozo e ao prazer sexual não atendida, criou asas e foi embora do Paraíso. A cada vez que uma mulher conta de seus desejos em voz alta, que age em sua inteireza, em sua força e criatividade, que respeita o seu mais íntimo feminino e não se deixa apequenar por mais ninguém, ela está sendo inspirada por Lilith.
Essa é a jornada que te convidamos a percorrer.
A jornada que nos torna Lilith.
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2 comentários
Começo hoje uma jornada renovada, de descobertas e de muito prazer comigo mesma.
Amei